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Há fome no Brasil?

Por: Carlos Oliveira

22/08/2019 às 07h56 Atualizada em 23/08/2019 às 01h06
Por: Carlos Oliveira
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A recente declaração do presidente Jair Bolsonaro negando que haja fome no Brasil causou grande repercussão negativa e despertou o debate sobre o tema. Por isso, me propus fazer uma reflexão filosófica sobre esse flagelo mundial.

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Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) a fome ainda não foi erradicada do Brasil. Os dados oficiais mais recentes, por exemplo, revelam que 3,6% dos brasileiros ainda vivem em condição de insegurança alimentar. Este índice corresponde, aproximadamente, a 7, milhões de pessoas. A partir desta constatação, pode-se dizer que de fato há (hoje) brasileiros que passam pela privação de alimentos. No entanto, em que pese o infeliz teor da declaração do presidente, não é necessariamente sobre o fato óbvio de haver famintos no Brasil e no mundo, nem mesmo sobre o quantitativo desses desalentados que queremos falar, mas sim sobre os possíveis fatores e responsáveis por esse dilema cruel e universal.

Geralmente, três apontamentos são elencados nessa hora. Primeiro apontamento: “é um problema de meritocracia”. Essa abordagem costuma culpar a própria vítima, acusando-a de não busca, por mérito próprio, superar suas adversidades. Segundo essa visão mais ‘capitalista’ do problema, cada um tem a vida que merece e escolheu para si. “Querer é poder”, “O que o homem planta, ele também colhe”, afirmam. Ou, dito à maneira de Thomas Hobbes, o homem é o seu próprio algoz. A solução neste caso, depende prioritariamente do sujeito. Por outro lado, um questionamento plausível à essa abordagem vem da filosofia Platônica: “é injusto tratar de forma igual pessoas tão diferentes”. Poderíamos perguntar, ainda: “quem lhes deu sementes para serem plantadas?” Ou, por fim, “quem lhes deu tempo para regar o plantio”? “Quem lhes permitiu colher?”;

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Segundo apontamento: “é um problema social e político”. Os adeptos dessa corrente geralmente culpam a classe política e a sociedade de um modo geral pelo surgimento e pela manutenção desse mal. De acordo com a teoria de Karl Marx, por exemplo, qualquer Estado (desde que não fosse comunista) estará, necessariamente, a serviço da classe burguesa dominante. O preço desse “favor” é a exploração e expropriação da classe pobre, que fica desassistida. Partindo dessa visão mais socialista, o problema da fome no mundo é antes de tudo um dilema político/social, e não de meritocracia. Logo, sua solução só virá de uma revolução social e política mudando a ordem do sistema, isto é, o Estado operar por, pelo e para o proletariado. Um questionamento possível a esse ponto de vista é: “Por que a fome e a miséria prevaleceram, e por vezes, se agravaram em países que adotaram o Socialismo/Comunismo como modelo de governo?” Ou, ainda, “por que nos países ditos capitalistas os números da fome são, geralmente, mais amenos?”

Terceiro apontamento: “é um problema ético”. Os entusiastas dessa perspectiva advogam que a apatia, a ganância, o egoísmo e egocentrismo do ser humano são a foça motriz desse letal flagelo mundial. Afirmam que a fome no mundo é

provocada pela má distribuição de riquezas, e relembram a responsabilidade ética que essa situação implica. A fome é um problema presente e crônico em todo o nosso planeta, mas não resulta em manchetes como as tragédias naturais esporádicas. Ontem, muitas pessoas morreram de subnutrição e doenças a ela associadas, e muitas mais morrerão hoje e amanhã. Mas ainda assim, as secas, as inundações, os furacões e terremotos, que eventualmente tiram as vidas de milhares de pessoas em um só lugar, são muito mais interessantes enquanto notícias.

A fome seria um problema ético porque o mundo é capaz de produzir (seja capitalista ou socialista) o suficiente para alimentar e abrigar a sua população. Essa situação é resultado da falta da transferência “partilha” das nossas riquezas. E não digo transferências apenas das riquezas dos países ricos para os mais pobres, mas a de cada um de nós, pois todos nós temos a oportunidade de fazer alguma coisa para amenizar essa situação. Temos, por exemplo, a oportunidade de dar nosso tempo ou um pouco do nosso dinheiro para organizações voluntárias.

Isto posto, cabe ainda perguntar se o fato de permitir que alguém morra é tão diferente do fato de matar alguém: pois, do contrário, fica a impressão de que somos todos assassinos. Peter Singer, filósofo do século XX, nos propõe o seguinte experimento mental: “Imagine-se em um parque onde você sabe que há um lago. Você ouve um barulho na água e depois alguém gritando. Então percebe que uma criança caiu e talvez esteja se afogando. O que você faz? Faz de conta que não percebeu? Ainda que tivesse prometido encontrar um amigo e que parar no caminho fosse um atraso, você certamente consideraria a vida da criança mais importante do que chegar no horário marcado. O lago é bem raso, mas muito turvo. Se ajudar a criança, vai destruir o seu melhor sapato. Mas não espere que os outros entendam se você não pular. Trata-se de agir como um ser humano e de valorizar a vida. A vida de uma criança vale muito mais do que qualquer par de sapatos”. Qualquer pessoa que pense diferente é um monstro, você diria.

Mas, por outro lado, continua ele, “você provavelmente tem condição financeira de evitar que uma criança morra de fome na África. É provável que isso não custe muito mais que o preço do seu último celular. Por que você não ajudou as outras crianças – supondo que não tenha ajudado? Doar um pouco de dinheiro para caridade salvaria pelo menos uma vida. Mas por que você não sente por alguém que morre na África a mesma coisa que sente por uma criança que se afoga diante de você?” Se você sente a mesma coisa, é alguém incomum. A maioria de nós não sente, mesmo que fiquemos levemente envergonhados por isso.

Segundo ele, a criança que se afoga diante de você e a criança que passa fome na África não são tão diferentes assim. Devemos nos importar mais do que nos importamos com aqueles que podemos salvar no mundo inteiro. Se não fizermos algo, as crianças que poderiam viver certamente vão morrer. Isso não é um palpite, é uma constatação fatídica. Sabemos que milhares de crianças morrem todos os anos de causas relacionadas à pobreza, enquanto nós jogamos fora alimentos que apodrecem no refrigerador.

Talvez você possa alegar que se não der dinheiro para caridade, provavelmente alguém dará. O risco nesse caso é de todos virarem espectadores, cada um partindo do pressuposto de que o outro fará o que é necessário. É claro que é muito mais fácil perceber uma pessoa ao ajudarmos uma criança que se afoga diante de nós. Diferentemente do exemplo acima, o sofrimento dessas outras crianças (reais) acontece distante de nós, logo é mais fácil nos esquivarmos e darmos desculpas (o que os olhos não vêm, o coração não sente). Diante disso, deveríamos, quiçá, agir de acordo com o princípio categórico de Kant: “age só segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”. Para não dizer que é utopia, lembremo-nos do mineiro Chico Xavier.

O último tópico elencado (problema ético) parece estar mais de acordo com a doutrina paulina. Em Atos, por exemplo, o estilo de vida dos apóstolos é baseado em posses comunitárias, na partilha e sem a propriedade individual. No mesmo livro diz que se distribuía a qualquer um à medida que alguém tinha necessidade. “Não havia, pois, entre eles necessitado algum; porque todos os que possuíam herdades ou casas, vendendo-as, traziam o preço do que fora vendido, e o depositavam aos pés dos apóstolos. E repartia-se a cada um, segundo a necessidade que cada um tinha.” A solução nesse caso seria, prioritariamente, cada um de nós praticar a caridade e a empatia pelo próximo. Como disse Jesus: “Ame o próximo como a ti mesmo”! Tirem suas conclusões!

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