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Como fica o Ensino Religioso nas escolas públicas após decisão do STF?

Por Carlos Oliveira

Paulo Sérgio
Por: Paulo Sérgio
02/10/2017 às 22h45
Como fica o Ensino Religioso nas escolas públicas após decisão do STF?

Como fica o Ensino Religioso nas escolas públicas após decisão do STF?

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Depois da decisão apertada no STF (6 voto a favor e 5 contra) o caráter confessional do Ensino Religioso nas escolas públicas, especialistas e sociedade debatem a questão. Diante dessa ‘chama’ que se acendeu, faço algumas reflexões sobre o tema. Primeiro, vamos entender um pouco a questão. O STF foi provocado a se manifestar por causa de um questionamento da Procuradoria-Geral da União a um decreto do governo federal de 2010, que oficializou um acordo entre o Brasil e a Igreja Católica. Desde então, o país conta com duas instruções sobre o ensino religioso, veja:

Lei de Diretrizes e Bases: Por um lado, a LDB diz que "o ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo".

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Acordo entre o Brasil e a Santa Sé: Por outro lado, no acordo firmado pelo governo federal e a Igreja Católica, um dos artigos afirma que "o ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação".

Essa disciplina é prevista em lei?

Como visto acima, aulas de religião na escola pública é assegurada, de acordo com a Constituição brasileira e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), desde que não sejam obrigatórias para os alunos e a instituição assegure o respeito à diversidade de credos e proíba o proselitismo, ou seja, a tentativa de impor um dogma ou converter alguém a determinada crença religiosa.

Veja a letra da lei: (CF-1988) artigo 210, parágrafo primeiro: "O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental". (Lei n.º 9.475/97) complementar a LDB, diz: "O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso." 

Com a decisão do STF, alguma religião será beneficiada?

A Rede Globo exibiu uma entrevista no programa (Conversa com Bial) “a meu ver, de maneira tendenciosa” opiniões de especialistas, que na sua maioria discorda da decisão do STF, pois, segundo eles, abre-se uma porta de favorecimento ao catolicismo, devido a sua estrutura educacional ser superior às demais religiões do Brasil. No entanto, eu vejo com outros olhos.

Não há dúvida, quanto a superioridade estrutural da educação católica no país, porém, não podemos, nem conseguiremos separar o elemento fé/religiosidade da cultura do nosso povo. O princípio democrático representativo, que rege a nossa sociedade, deve ser observado e respeitado também na cultura e na religião do nosso povo. Se a nossa sociedade é composta majoritariamente por cristãos (87%), sobre tudo católicos, é justo, compreensível e esperado que seus princípios e valores sejam mais visíveis em todos os setores da sociedade, ou seja, na política/cultura/arte/religião etc.

Não observar essa premissa com naturalidade, parafraseando um princípio Platônico: “Muitos reprovam a tirania apenas para que possam estabelecer a sua”, no que pode-se entender (criticar e resistir a presença/supremacia do cristianismo/catolicismo, apenas para elevar a nossa) incorre-se assim, no erro de ‘combater a intolerância com a intolerância’. Ou como diria Paulo: “não se vence o mal com o mal, mas com o bem”, logo, só se pode vencer a intolerância com o respeito e o conhecimento.

Num país, cuja maioria absoluta da população (87%) se declara cristã, deveria ser sinônimo de respeito ver e ouvir seus ideias, nos diferentes ambientes do território, com naturalidade. E isso não exclui a escola. Essa realidade de ‘primazia cultural’ vale também para o Oriente, onde os Mulçumanos, Hindus, Budistas etc. exercem suas hegemonias que, por sinal, é muito bem respeitada pelas demais religiões. Por aqui tem de ser diferente!? Entendo, portanto, que se o Estado laico não deve promover nenhuma religião, muito menos cercear ou suprimir quaisquer delas, ainda que com pretexto de ‘praticar isonomia’. O que não deve haver é a prática da intolerância para com as demais religiões e isso a lei já regula.

Qual a necessária dessa disciplina nas escolas?

Em um mundo tão cercado por intolerância, com crescentes atos de “terrorismo motivado pela religião”, somados a uma sociedade cada vez mais acelerada, onde as ‘informações’ são obtidas muito mais rápidas de forma que os indivíduos estão se reclusando cada vez mais, onde alguns valores importantes já fazem parte do passado, a necessidade de ensinar e trazer de volta alguns ensinamentos que são encontrados na religião se faz perene e urgente.

Por isso, ela é importantíssima para refletirmos em soluções contra essas e todas as outras formas de violência contra a liberdade humana. A religião, seja ela qual for, irá trazer princípios éticos e filosóficos básicos, onde a criança/adolescente futuramente, poderá decidir se seguirá ou não. Até lá ela terá em mente bons princípios, tais como o bom relacionamento com o próximo, o verdadeiro valor da família e de como ela já é e sempre será importante para a sociedade.

Nessa perspectiva, o Ensino Religioso ofertado de maneira obrigatória nas instituições de ensino e opcional ao aluno valoriza a diversidade cultural e religiosa viabilizando na escola pública o exercício da tolerância e o respeito à diversidade com consequentes reflexos positivos para a redução de conflitos ressaltando questões de formação da pessoa humana, do cidadão e do convívio harmônico em sociedade

Por fim, qual é a realidade desse ensino no Estado de Minas Gerais? A Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais (SEE-MG) regula tanto o perfil dos professores, que passam por concurso público ou são designados para essa função e precisam ter formação específica na área, como também orienta o conteúdo a ser repassado. A orientação é ofertar um ensino (inter-religioso) isto é, que não foca numa só doutrina, mas, pelo contrário, apresenta de forma genérica aspectos históricos, filosóficos e sociais das diversas religiões do Brasil, com atenção especial para os seus valores comuns. Portanto, as aulas são de caráter não confessional e são trabalhados temas como família, formação cidadã, valores, princípios éticos e outros temas que possam contribuir para uma melhor formação do cidadão.

 

*Por Carlos Oliveira: professor de Ensino Religioso na rede estadual de Minas, licenciado em Filosofia, graduado em Teologia, pós-graduado em política e Ciências da Religião.

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