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Famílias reclamam do silêncio sobre mortes em presídios

Em 2013, nove detentos perderam a vida em unidades prisionais espalhadas pelo Estado

Paulo Sérgio
Por: Paulo Sérgio Fonte: Foto:Uarley Valerio/Otempo
16/02/2014 às 23h33
Famílias reclamam do silêncio sobre mortes em presídios
Há quase um ano, a dona de casa Maria Deltina Teixeira dos Santos, 50, recebeu uma notícia que mudaria para sempre sua história: a morte do filho. Acusado de tráfico de drogas, Jorge Davidson Teixeira Reis, 23, dividia uma cela no presídio Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, na região metropolitana, com outros 21 detentos, quando levou 47 facadas. Ele estava preso havia três meses. “Quem me dera se tivessem cuidado do meu filho, ou se, na hora da briga, tivesse um agente por perto. Mas ninguém fez nada para salvar a vida dele”, lamenta a mãe do jovem.

A família de Maria Deltina é apenas mais uma entre as tantas que choram o assassinato de filhos dentro de presídios em todo o país. Em Minas, nove presos foram mortos em unidades prisionais no ano passado, de acordo com a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds). No Brasil, foram pelo menos 218 homicídios – 60 somente no Maranhão –, segundo o jornal “Folha de S. Paulo”. Mais que a dor da perda, as mães lamentam o descaso do Estado.

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“A única coisa que sei foi que enterrei um filho na cadeia. Já vai fazer um ano, e sou obrigada a engolir essa tristeza sem saber o motivo. Ninguém nunca me deu uma satisfação”, desabafa Maria Deltina.

Histórias como essa se repetem em Minas. Há pouco mais de um mês, a cuidadora de idosos Maria do Carmo Silveira, 54, enterrou o filho, Thiago Vinícius Silveira, no dia em que ele faria 31 anos. Ele estava preso havia apenas seis dias no Centro de Remanejamento do Sistema Prisional (Ceresp) Gameleira e foi encontrado morto. Suspeito de furto, ele dividia cela com três presos. “Meu filho roubava para manter o vício do crack. Ele precisava ser tratado como drogado, e eu pedi ajuda em todos os lugares que você pode imaginar, mas não fui atendida”, conta Maria do Carmo.

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Apesar da hipótese de suicídio, a cuidadora tem certeza de que Thiago, que deixou uma filha de 6 anos, foi assassinado. Ele não entrou nos registros da Seds porque a morte foi em 2014 e ainda está, segundo o órgão, em apuração. Maria do Carmo quer criar uma fundação para dar apoio a mães de presidiários. “Não estou chorando só a morte do meu filho, que a sociedade tratou como bandido. Choro a falta que o Estado faz a quem precisa.”

Há quase quatro anos, o garçom Cristiano Fernandes, 32, foi morto por colegas de cela após ser detido por suposto estupro de incapaz em Alfenas, no Sul de Minas. Em princípio, a perícia chegou a declarar que houve suicídio, mas depois retrocedeu e constatou o homicídio. “A família da criança chegou a aventar a possibilidade de retirar a queixa, mas não o fez. Cristiano foi morto dias depois”, conta o defensor criminal Geraldo Lopes.

NÚMEROS. Para o presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas (OAB-MG), Adilson Rocha, as nove mortes no Estado são poucas, considerando-se a dimensão da população carcerária. Atualmente, cerca de 50 mil presos estão detidos em 142 unidades prisionais da Seds. Ainda assim, os homicídios, normalmente motivados por rixas, são motivo de preocupação. “O sistema penitenciário no Brasil exige que a pessoa seja forte para conseguir sobreviver”, diz Rocha.

Resposta
Apuração.
 A Seds informou que os casos são investigados internamente e também pela Polícia Civil.O contato com os familiares é feito pelo Núcleo de Serviço Social de cada unidade.

Para pastoral, há subnotificação

Dados.  Assessor jurídico da Pastoral Carcerária Nacional, José de Jesus Filho acredita que existe subnotificação dos casos e que as mortes em presídios de Minas ocorrem em maior quantidade. “O número de mortes é muito maior. Mortes que ocorrem em carceragens da Polícia Civil não são notificadas, e algumas que ocorrem em prisões são registradas como em trânsito ou no hospital”.

Falha. Na visão dele, a subnotificação é regra. “Há uma ignorância geral sobre o que há nas prisões. E isso acontece em decorrência da falta de seriedade com a política penitenciária”, critica José de Jesus Filho.

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