Baratas, moscas e larvas não estão no cardápio das unidades dos sistemas prisional e socioeducativo do Estado, mas nem por isso tem sido incomum encontrá-las nas refeições fornecidas aos servidores e às pessoas privadas de liberdade. Ao menos é o que denunciaram policiais penais que compareceram em peso a audiência da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta terça-feira (25/4/23).
As queixas não são novas, mas denúncias continuam sendo recebidas pela comissão, que já tratou do assunto em outras oportunidades. Os casos mais recentes de más condições de higiene e transporte dos alimentos foram relatados em unidades da Zona da Mata, em Juiz de Fora, e na região Noroeste, em Unaí e Paracatu, onde até mesmo um gambá foi visto junto à comida.
Luzana Moreira, presidente do Sindicato dos Servidores do Sistema Socioeducativo do Estado, afirmou já ter presenciado larvas no feijão e no peixe, sucos e café em péssimas condições e refeições que de tão azedas foram recusadas pelos internos.
Ela também informou que, nas unidades onde a gestão é compartilhada com organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips), é constante o atraso na oferta de alimentos, sendo que as frutas nem mesmo chegam aos servidores.
Segundo Jean Carlos Rocha, presidente do Sindicato dos Policiais Penais do Estado, cerca de R$ 50 milhões são gastos por mês na compra de alimentos para servidores e detentos, dinheiro que estaria indo para o ralo devido à contaminação das marmitas.
Ele também reclamou da oferta de alimentos com baixo valor nutricional (como embutidos), do fato de as refeições oferecidas para os policias penais e os presos terem o mesmo valor calórico, apesar das necessidades diferentes, e da suposta perseguição a agentes de segurança que denunciam os problemas encontrados, mais especificamente na unidade de Paracatu onde o gambá foi encontrado.
José Lino Esteves, presidente do Sindicato dos Auxiliares, Assistentes e Analistas do Sistema Prisional e Socioeducativo, que também atua como fiscal do contrato de alimentação na unidade em que trabalha, confirmou ter encontrado diversas irregularidades no local onde os alimentos destinados à instituição são processados, como ferrugem, sujeira e a presença de insetos.
Assim como outros participantes da audiência, também reclamou do tratamento diferenciado dado a servidores do sistema prisional, uma vez que algumas unidades pagam auxílio alimentação e a maioria não, e da prática recorrente de troca de CNPJ das empresas que são penalizadas pela oferta indevida de alimentos, para que continuem prestando o serviço.
Representando o secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, a subsecretária de Gestão Administrativa, Logística e Tecnologia, Ana Luisa Falcão, informou que Minas possui 106 contratos vigentes, com 22 empresas, para a oferta de alimentos em 195 unidades dos sistemas prisional e socioeducativo.
As empresas são contratadas por meio de pregão eletrônico e os contratos têm a validade de dois anos.
Sobre as irregularidades encontradas, a gestora explicou que todas as denúncias feitas pelos canais oficiais são apuradas. Em 2022, elas resultaram em 4,5 mil notificações e R$ 7,5 milhões em multas às empresas infratoras. As maiores penalidades previstas nos processos administrativos punitivos são a rescisão do contrato e a impossibilidade de contratação com a administração pública.
Ainda de acordo com a subsecretária, desde 2019 as refeições dos servidores possuem o dobro de proteínas daquelas ofertadas às pessoas privadas de liberdade.
Quanto às medidas adotadas pela secretaria para coibir a prática de má conservação e distribuição dos alimentos, Ana Luisa Falcão disse que a pasta busca a capacitação de gestores e fiscais dos contratos, assim como o reforço das equipes de fiscalização e responsáveis pelos processos punitivos.
Presidente da Comissão de Segurança Pública e autor do requerimento para a audiência, o deputado Sargento Rodrigues (PL) defendeu que, até que a secretaria tome uma decisão definitiva para contornar o problema, os contratos para a alimentação dos servidores sejam separados dos relativos aos detentos.
O seu posicionamento foi seguido pelos deputados Coronel Sandro (PL), Eduardo Azevedo (PSC) e Delegado Christiano Xavier (PSD). Os dois últimos defenderam também o pagamento de auxílio alimentação para todos os policias penais. “Licitar, gerir e fiscalizar o contrato é muito mais difícil e caro do que liberar o ticket alimentação”, resumiu Christiano Xavier.
O deputado Leleco Pimentel (PT) disse já ter apresentado requerimento com pedido de informações ao titular da Secretaria de Justiça e Segurança Pública sobre a oferta de refeições nas unidades prisionais, incluindo a obrigatoriedade de compra de alimentos oriundos da agricultura familiar.
Durante a reunião, também foram apresentados requerimentos, que serão posteriormente votados, para que seja agendada uma visita ao secretário e para que o diretor do presídio de Paracatu e o diretor da regional a que ele está vinculado sejam convocados a prestar esclarecimentos sobre a suposta intimidação de um servidor que denunciou a presença de um gambá na comida.
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